Princípio da impessoalidade no Direito Administrativo
Princípio da impessoalidade
Trata se de um princípio de
extrema importância para o direito administrativo, visto que estabelece um
dever de imparcialidade na defesa do interesse público, impedindo
discriminações e privilégios.
Devemos estudar este
princípio sob duas óticas diferentes, quais sejam:
a) Como
determinante da finalidade de toda a atuação administrativa;
b) Como
vedação à que o agente público se promova às custas das realizações da
administração pública.
Passaremos a decifrar ambos
os prismas acima citados, frisando que tais óticas acarretam no surgimento de
dois subprincípios da impessoalidade.
1. Princípio da finalidade
O princípio da
impessoalidade, olhado sob o prisma do administrado, constatamos a existência
da finalidade da atuação administrativa, que é considerado um princípio
constitucional implícito, decorrente do princípio da finalidade.
O princípio da finalidade
traz em si a ideia de que toda a atuação da administração pública tem por
objetivo a satisfação do interesse público, ou seja, visa atender o interesse
de todos.
Em outras palavras, o aludido
princípio visa impedir que o agente público, no exercício de sua função ou em
razão dela, pratique ato administrativo que tem por objetivo a satisfação do
próprio interesse ou de terceiros em face da administração pública.
Ou seja, o agente público, ao
praticar o ato administrativo fica adstrito a satisfação da vontade geral,
consubstanciada pela vontade da lei.
Nas palavras de Marcelo
Alexandrino e Vicente Paulo, este preceito “impede perseguições ou
favorecimentos, discriminações benéficas ou prejudiciais aos administrados”.
Importante consignar que a principal
consequência pela inobservância do princípio da finalidade é o reconhecimento
da nulidade do ato administrativo por desvio de finalidade.
Outra consideração relevante
a ser feita é que, além do disposto no artigo 37 da Constituição Federal, o artigo
5º caput, da Constituição Federal preceitua que todos são iguais perante
a Lei, não se admitindo em nosso ordenamento jurídico qualquer distinção, o que
corrobora uma das bases do princípio da finalidade, qual seja: a igualdade
entre todos que estão sujeitos a atuação da administração pública.
Percebe-se que o princípio da
finalidade, como desdobramento do princípio da impessoalidade, decorre de um
dos preceitos basilares do Estado Democrático de Direitos, a isonomia (ou
igualdade) e encontra desdobramentos expressos no texto constitucional, além
daquele mencionado no parágrafo anterior, vejamos:
Art.
37, inciso II, da CF – a investidura em cargo ou emprego público depende de
aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de
acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista
em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de
livre nomeação e exoneração. (g.n.)
O citado preceito
constitucional é aplicado aos concursos públicos de provas ou provas e títulos,
no qual determina que os candidatos competem em igualdade de condições entre
si, ressalvadas as exceções legalmente previstas em nossa legislação
infraconstitucional, p.ex., pessoas com deficiência (art. 5º, §2º, da Lei nº.
8.112/1990) e quota racial (art. 1º da Lei nº. 12.990/2014)
Neste momento, imperioso
fazer uma reflexão acerca das exceções à igualdade de candidatos em concurso
público, cujos fundamentos são art. 5º, §2º, da Lei nº. 8.112/1990 e art. 1º da
Lei nº. 12.990/2014.
Art.
5º, §2º, da Lei nº. 8.112/1990 - Às
pessoas portadoras de deficiência é assegurado o direito de se inscrever em
concurso público para provimento de cargo cujas atribuições sejam compatíveis
com a deficiência de que são portadoras; para tais pessoas serão reservadas até
20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso
Art.
1º da Lei nº. 12.990/2014 - Art. 1º Ficam reservadas aos negros 20% (vinte por
cento) das vagas oferecidas nos concursos públicos para provimento de cargos efetivos
e empregos públicos no âmbito d a administração pública federal, das
autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de
economia mista controladas pela União , na forma desta Lei.
Perceba que a reserva de
vagas para pessoas com deficiência ou para negros não ofende o preceito da
igualdade, basilar no concurso público, pois encontram-se expressamente
previstas em Lei que, em última análise, representa a vontade geral.
Por isso, quando há reserva
de vagas em concurso público para pessoas com deficiência e/ou negros, decorre
única e exclusiva da vontade geral.
Retomando a reflexão sobre a
igualdade prevista no bojo da Constituição Federal, cabe a nós consignarmos o
disposto no artigo 37, inciso XXI, da Constituição Federal:
Art.
37, inciso XXI, da CF - ressalvados os casos especificados na legislação, as
obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de
licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes,
com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições
efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências
de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento
das obrigações. (g.n.)
Este dispositivo
constitucional consigna que o processo de licitação pública tem por base a
igualdade de condições entre os licitantes.
Contudo, até mesmo na Lei de
´Licitação Pública (Lei nº. 8.666/1993), existe exceção à igualdade, vejamos:
Art.
44 da Lei Complementar nº. 123/2006 - Nas licitações será assegurada, como
critério de desempate, preferência de contratação para as microempresas e
empresas de pequeno porte. (g.n.)
§ 1º
- Entende-se por empate aquelas situações em que as propostas apresentadas
pelas microempresas e empresas de pequeno porte sejam iguais ou até 10% (dez
por cento) superiores à proposta mais bem classificada.
§ 2º
- Na modalidade de pregão, o intervalo percentual estabelecido no § 1o deste
artigo será de até 5% (cinco por cento) superior ao melhor preço.
Sem querer adentar no tema de
licitação pública, percebe-se que o critério de desempate eleito pela Lei
Complementar nº. 123/2006 (conhecida como Estatuto da microempresa e da empresa
de pequeno porte) relativiza a igualdade de condições entre os participantes.
Com isso, nosso objetivo,
além de demonstrar a relação umbilical existente entre os princípios da
finalidade, da impessoalidade e da igualdade, era, também, asseverar que nenhum
princípio em nosso ordenamento jurídico é absoluto, podendo ser relativizado
diante do caso concreto, em homenagem à ponderação, a proporcionalidade e a
razoabilidade.
A finalidade da atuação da
administração pública pode constar de forma expressa ou implícita na legislação
infraconstitucional.
A título de exemplificação do
parágrafo anterior, o princípio da finalidade encontra previsão expressa no
artigo 2º da Lei nº. 9.784/1999, que trata do processo administrativo no âmbito
da administração pública federal, e implícita no inciso XIII do parágrafo único
do artigo 2º da Lei nº. 9.784/1999, vejamos:
Art.
2º da Lei nº. 9.784/1999 – A Administração Pública obedecerá, dentre
outros, aos princípios da legalidade, finalidade, motivação,
razoabilidade, proporcionalidade, moralidade, ampla defesa, contraditório,
segurança jurídica, interesse público e eficiência. (g.n.)
Art.
2º, § único, da Lei nº. 9.784/1999 – Nos processos administrativos serão
observados, entre outros, os critérios de (inciso XIII) interpretação da norma administrativa da
forma que melhor garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa de nova
interpretação. (g.n.)
Ainda, a finalidade deve ser
compreendida como sendo geral e específica.
A finalidade geral é a
satisfação do interesse público, ao passo que a finalidade específica é o fim
direto ou imediato a que a lei se pretende.
A título de exemplo, em uma
desapropriação de bens imóveis de um bairro para a construção de uma ponte que
permitirá maior mobilidade na Cidade. A finalidade geral é representada pelo
interesse público em uma melhor mobilidade dentro do município, ao passo que a
finalidade específica é consagrada pela desapropriação com a pretensão de
construção da ponte.
Importante observar que, na
hipótese de desapropriação dos bens imóveis decorre da intenção do
administrador público, por exemplo, de prestigiar amigos ou prejudicar
desafetos políticos, tais atos administrativos devem ser considerados nulos,
por desvio de finalidade.
2. Vedação da promoção pessoal
O princípio da
impessoalidade, olhado sob a ótica do administrador público, se pode constatar
a vedação da promoção pessoal.
Esta vedação impede que as
realizações da administração pública, tais como, obra, serviços, políticas
públicas, entre outros, sejam vinculadas a imagem do administrador público.
Em outras palavras, há a
proibição a vinculação da atividade da administração pública à pessoa do
administrador público, pois as realizações pertencem a administração pública
que, em última análise, pode ser atribuída a todos.
A proibição da promoção
pessoal do administrador público encontra-se positivada no artigo 37, §1º, da
Constituição Federal, in verbis:
Art.
37, §1º, da CF - A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas
dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação
social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem
promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos. (g.n.)
Acerca da expressão
publicidade, empregada pelo Constituinte Originário, não guarda relação com o
princípio da publicidade, que será estudado no momento oportuno, mas sim com o
sentido de propaganda realizada pela administração pública.
Sobre a vedação da promoção
pessoal, percebe-se que o Constituinte Originário visa impedir que o agente
público se utilize da “máquina pública” para realizar sua promoção pessoal.
Portanto, por exemplo, a
construção do viaduto não é obra do Prefeito João da Silva, mas sim do
Município de Mogi das Cruzes/SP e assim sucessivamente.
Nesta oportunidade, cabe
consignar que o Supremo Tribunal Federal (STF) ao apreciar o mencionado
dispositivo legal, não permite qualquer espécie de vinculação entre a
propaganda oficial e a pessoa titular do cargo público.
Neste sentido, transcrevemos
celebre decisão tomada pelo STF, no R.E. nº. 191.668/RS, de relatoria do Min.
Menezes Direito, em 15/04/2008, in verbis:
O
caput e o parágrafo 1º do artigo 37 da Constituição Federal impedem que haja
qualquer tipo de identificação entre a publicidade e os titulares dos cargos
alcançando os partidos políticos a que pertençam. O rigor do dispositivo
constitucional que assegura o princípio da impessoalidade vincula a publicidade
ao caráter educativo, informativo ou de orientação social é incompatível com
a menção de nomes, símbolos ou imagens, aí incluídos slogans, que caracterizem
promoção pessoal ou de servidores públicos. A possibilidade de vinculação
do conteúdo da divulgação com partido político a que pertença o titula do cargo
público mancha o princípio da impessoalidade e desnatura o caráter
educativo, informativo ou de orientação que constam do comando posto pelo
constituinte dos oitenta. (g.n.)
Percebe-se que a posição do
STF é no sentido de proibir qualquer tipo de vinculação entre a publicidade
realizada pela administração pública e a promoção pessoal do administrador
público, estendendo-se tal vedação aos partidos políticos ocupantes de cargos
no governo.
Por fim, mas não menos
importante, observamos que o disposto no inciso III do parágrafo único do
artigo 2º da Lei nº. 9.784/1999, que trata
do processo administrativo no âmbito da administração pública federal, prevê,
expressamente, a vedação da promoção pessoal.
Art.
2º, § único, da Lei nº. 9.784/1999 – Nos processos administrativos serão
observados, entre outros, os critérios de (inciso XIII) objetividade no atendimento do interesse público,
vedada a promoção pessoal de agentes ou autoridades
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